quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Desvalorização do ensino e degradação da Escola Pública

FENPROF prepara e incentiva discussão com os professores sobre a “revisão da estrutura curricular” proposta pelo MEC e sublinha que "é preciso tempo"
Embora tendo como tema central, previamente anunciado, a revisão da estrutura curricular, a conferência de imprensa que a FENPROF realizou após dois dias de reunião do seu Secretariado Nacional, nesta terça-feira, dia 20, não deixou passar, naturalmente, a “surpresa”, conhecida uma hora antes do início deste encontro com a comunicação social: o anunciado novo corte de mais 380 milhões de euros no setor da Educação, em sintonia com as diretrizes da “troika”. Para além, registe-se, do corte de 1500 milhões (700 em salários e 800 em funcionamento), contemplado no Orçamento de Estado (OE) para 2012, que ainda não entrou em vigor. “Isto é verdadeiramente obsceno e criminoso, isto é de uma irresponsabilidade total, tanto mais quando se sabe que o nosso país ocupa o último lugar dos 27 da UE na relação da educação com o PIB ”, como sublinhou Mário Nogueira no diálogo com os jornalistas.
O novo corte, alertou o Secretário Geral da FENPROF, vai significar "uma escola pior, com mais professores no desemprego". E acrescentou: "O Governo está a preparar as cerimónias fúnebres da escola pública de qualidade; este é o verdadeiro objetivo destas políticas".
"Este PM não serve para nada!"Salientando que "estão a pôr em causa o futuro do país - livre e soberano, com autonomia para tomar decisões", o dirigente sindical acusou o Primeiro Ministro de "desistir do futuro do país", lembrando as suas propostas para os professores que estão no desemprego: "Passos Coelho disse-lhes para desaparecerem daqui, para emigrarem, que aqui não há nada para lhes dar!..." "Isto é deitar fora o garante do futuro", realçou Mário Nogueira, que afirmaria ainda: "Este PM não serve para nada. Devia ser o primeiro a agarrar nos remos e a pôr-se a andar".
"Cortar é o que está em cima da mesa""Esta revisão da rede escolar é apenas uma peça do puzzle que tem como objetivo central a desvalorização do ensino e o ataque à escola pública. Parte contaminada à nascença, ignorando as realidades e os desafios que se colocam a uma escolaridade de 12 anos. Parte de um memorando assinado com a troika, que definiu que tem que se cortar a torto e a direito, e de um OE que define um corte de 102 milhões através de alterações curriculares. O objetivo é só cortar: cortar no funcionamento da escola pública, cortar nos professores. Cortar é o que está em cima da mesa", referiu o Secretário Geral da FENPROF.
Depois de sublinhar que "há aqui uma visão economicista e uma carga ideológica que visa a alteração do que é hoje a escola pública", Mário Nogueira declarou que esta revisão curricular não tem em conta a formação integral do indivíduo, de "um cidadão crítico e interveniente", acusando o MEC de pretender uma escola do "ler, contar e escrever e de só mais alguma coisa (pouca)". "As expressões também são essenciais, tal como o estudo acompanhado, a formação cívica, as ciências experimentais", acrescentou.Nuno Crato, observou Mário Nogueira, "não esconde" esta opção e já por várias vezes enalteceu o sistema norte-americano, em que há uma escola destinada às elites e depois uma outra, "dos mínimos, para o resto da população. Isto não está na Constituição da República Portuguesa", salientou o dirigente sindical, que relacionou o ataque à escola pública com as políticas da "liberdade de escolha" e do "cheque ensino".
Menos 11 580 horáriosTendo com base a realidade nacional dos 794 agrupamentos de escola, dos 7 628 estabelecimentos integrados em agrupamentos, das 283 escolas secundárias não agrupadas e das 213 secundárias que integram agrupamentos, e tendo ainda em consideração o horário letivo médio dos docentes dos ensinos básico e secundário, o número de turmas e o número médio de alunos por turma, esta reestruturação desenhada pelo MEC implica que fiquem no desemprego mais 10 000 professores. Mário Nogueira apresentou as "parcelas" desta conta, explicando, por exemplo, que a extinção da Formação Cívica e do Estudo Acompanhado provocam menos 3 000 horários, que as alterações em EVT (com EV e ET) fazem perder outros 3 000 horários e que as alteraçõers na disciplina de Ciências da Natureza apontam para menos 1200 horários. E mais: a extinção da Formação Cívica e do EA no 3º Ciclo conduzem a um decréscimo de 2070 horários, as alterações do modelo de desdobramento pelo de "alternância" em Ciências Naturais e Físico-Química provocam menos 1610 horários e as eliminações no Secundário sem consideração de trienal a opção anual 1 apontam para menos 700 horários. A soma dá 11 580 horários, correspondendo, assim, a cerca de 10 000 professores afetados.
"As outras peças do puzzle"A FENPROF também chamou a atenção para "as outras peças do puzzle", que o MEC de Nuno Crato quer ampliar, nomeadamente no capítulo do encerramento de escolas, da imposição dos mega-agrupamentos e do aumento do número de alunos por turma. "Isto tem impacto em todos os professores, afetando todo os grupos disciplinares", registou Mário Nogueira neste encontro com a comunicação social, em que também participaram Anabela Delgado (SPGL), Manuela Mendonça (SPN), João Louceiro (SPRC), Joaquim Páscoa (SPZS), Marília Azevedo (SPM) e António Lucas (SPRA).
"O que é que vamos fazer?""Os professores têm que se envolver na discussão desta revisão curricular", salientou Mário Nogueira. "Vamos promover reuniões nas escolas, em todo o país para ouvir as opiniões dos professores. Vamos reunir com as associações profissionais e científicas, com as confederações de pais e encarregados de educação e com as associações dos diretores de escolas/agrupamentos", acrescentou.O Secretário Geral da FENPROF revelou ainda que vai ser editado e divulgado um cartaz para dinamização deste trabalho e que vão decorrer reuniões do Secretariado Nacional e do Conselho Nacional (órgão máximo da Federação entre Congressos).
"É preciso tempo para realizar este debate a nível nacional. Os professores têm que ser ouvidos", realçou Mário Nogueira. / JPO